segunda-feira, 31 de março de 2014

Inflação cai na Eurozona a menor nível desde a crise financeira


Inflação cai na Eurozona a menor nível desde a crise financeira


BRUXELAS, 31 Mar 2014 (AFP) - A inflação na Eurozona caiu em março a 0,5%, seu nível mais baixo desde a crise financeira de 2008-2009, o que alimenta temores de deflação e volta os olhares para a reunião de quinta-feira do Banco Central Europeu (BCE).

A primeira estimativa publicada nesta segunda-feira pelo Eurostat da inflação para março se situou abaixo do consenso dos analistas, que previam 0,6%.

Em fevereiro, a Eurozona registrou uma inflação de 0,7%, uma leve queda em relação a janeiro e dezembro, quando marcou 0,8%. Com exceção de novembro, quando a Eurozona registrou 0,9% de inflação, o índice de preços cai há dois anos.

Em março de 2013, a Eurozona registrou uma inflação de 1,7%. Um ano antes, em 2012, foi de 2,7%. O índice de março é o mais baixo em 52 meses, segundo os analistas.

Quando a inflação caiu a 0,7% em outubro passado, o Banco Central Europeu (BCE) reagiu baixando as taxas de juros em sua reunião de novembro a 0,25%, um nível historicamente baixo.

No entanto, não decidiu fazer o mesmo em sua última reunião do início de março. Em fevereiro, o presidente do BCE, Mario Draghi, negou que a Eurozona sofresse de um episódio de deflação.

Este nível de inflação "alimentará o debate sobre novas medidas monetárias do BCE", estimou Martin van Vliet, analista do ING. Na quinta-feira os governadores do BCE realizam sua reunião mensal.

A deflação é um fenômeno nocivo para o dinamismo de uma economia, já que adia as decisões de compra - com a expectativa de que os preços sigam caindo - e desencoraja, por isso, os investimentos.

Entre os principais componentes da evolução do índice de preços para março, a energia registrou uma contração de -2,1%, enquanto a taxa mais elevada foi registrada pelos serviços (1,1%). A alimentação, as bebidas alcoólicas e o tabaco marcaram 1%.

Os analistas afirmam, no entanto, que a baixa inflação de março deve-se, em parte, a um fenômeno estacionário no qual os consumidores adiaram suas decisões de compra "por fatores temporais em tempos de Páscoa", como ressaltou Ben May, economista da Capital Economics.

"Nos surpreenderia se o BCE agisse se baseando em uma inflação distorcida pela Páscoa", indicou Martin van Vliet.

Mas mesmo assim os analistas consideram a taxa de inflação como anormalmente baixa, muito longe dos 2% recomendados pelo BCE, e supõem que a entidade financeira deverá tomar novas medidas.

Howard Archer, economista-chefe do IHS Global Insight, considera a possibilidade de que o BCE tome novas medidas para injetar liquidez no sistema. Em sua opinião, é possível que, no futuro, baixe sua taxa de 0,25% a 0,15% ou inclusive 0,10%, mas não a deixaria no negativo. Archer descarta uma nova operação de financiamento no longo prazo (LTRO, por Long-Term Refinancing Operation), que "demostrou ser muito controversa (...) embora existam membros do BCE que a apontem como uma possibilidade".

"Vamos supor que o BCE vá manter a taxa de juros sem mudanças na quinta-feira", previu Martin van Vliet, que destaca que Draghi "espera que a inflação retorne ao recomendado até o fim de 2016".

"O risco de deflação segue presente", declarou Ben May. "Por isso seguimos pensando que é só questão de tempo antes que o Conselho de Governadores (do BCE) conclua que deve colocar em obra mais políticas monetárias para evitar no médio prazo um índice de inflação pior", acrescentou.

Segundo Howard Archer há cinco países na Eurozona que registram deflação. À Grécia, Chipre, Portugal e Eslováquia se somou neste mês a Espanha (-0,2% interanual em março).

Economistas das instituições financeiras elevam projeção de inflação pela quarta semana, diz BC


Economistas das instituições financeiras elevam projeção de inflação pela quarta semana, diz BC

Economistas de instituições financeiras elevaram pela quarta semana a projeção de inflação para este ano, a 6,30% ante 6,28%, mantendo a perspectiva para a taxa básica de juros, a Selic, em 11,25% em 2014, segundo o boletim Focus, do Banco Central, desta segunda-feira (31).
Os economistas também apostaram em nova alta de 0,25 ponto percentual na Selic,atualmente em 10,75%, na reunião desta semana do Comitê de Política Monetária (Copom).
Sobre o crescimento da economia neste ano, medido pelo PIB (Produto Interno Bruto), a estimativa foi de 1,69%, ante 1,7%, da semana anterior.
A expectativa para a cotação do dólar até o fim do ano é de R$ 2,46, contra R$ 2,49 da semana passada.

Expectativas para 2015

Para o ano que vem, os economistas mantiveram projeção de inflação de 5,8%.
A projeção da Selic foi mantida em 12%, e a do PIB também permaneceu inalterada, em 2%.
A estimativa para a cotação do dólar de R$ 2,55 na última semana também foi mantida.

Entenda o que é o boletim Focus

Toda segunda-feira, o Banco Central (BC) divulga um relatório de mercado conhecido como Boletim Focus, trazendo as apostas dos economistas para os principais indicadores econômicos do país.
Mais de cem instituições são ouvidas e, excluindo os extremos, o BC calcula uma mediana das perspectivas do crescimento da economia (medido pelo Produto Interno Bruto, o PIB), perspectivas para a inflação e a taxa de câmbio, entre outros. Mediana apresenta o valor central de uma amostra de dados (desprezando os menores e os maiores valores).
(Com Reuters)

quarta-feira, 26 de março de 2014

Banco Central Europeu admite: os governos europeus erraram ao castigar os trabalhadores


O próprio BCE admite que é necessário controlar os fluxos de capital, enquanto os governos preferem castigar os trabalhadores.

Antônio Cruz/ABr

A narrativa da direita para explicar a crise na Europa tem duas vertentes. 
 
Primeiro, considera que os governos foram irresponsáveis nos gastos e, por isso, provocaram uma crise da dívida soberana. 
 
Segundo, insiste que os altos custos salariais nos países da periferia europeia provocaram a destruição de sua competitividade e causaram um déficit insustentável na conta corrente. Supõe-se que isto tenha provocado os  desequilíbrios estruturais entre economias superavitárias e países deficitários. 
 
Ambas visões da crise estão equivocadas, mas a direita insiste em mantê-las como verdade absoluta e os meios de (des)informação martelaram tanto esta história que muita gente acabou acreditando que ela tem alguma ponta de verdade. 
 
Para a direita, esta visão dos fatos é útil porque os governos e os trabalhadores se dão mal. Os primeiros gastaram além da conta, os segundos (por meio de seus sindicatos) distorceram os salários no mercado de trabalho. Ambos, governos e trabalhadores, devem, portanto, suportar o ajuste derivado da crise. Daí surge a ideia de que a austeridade e a desvalorização fiscal são medidas justas e corretivas. As duas ações afundaram a Europa na pior crise de sua história. 
 
Os dados não apoiam a ideia de irresponsabilidade fiscal: em 2007, o ano em que a crise estala nos Estados Unidos, as contas públicas dos membros da União Europeia mostram um bom panorama. 
 
O déficit público agregado na União Europeia era de 0,8% do PIB (e 0,6% na Zona do Euro). A maior parte dos países que depois sofreram impactos da crise de maneira mais forte tinha um bom desempenho fiscal e havia se ajustado aos critérios do Tratado de Maastricht e do Pacto de crescimento e de estabilidade. 
 
Mas à medida que a crise afetava os setores reais da economia, as contas públicas começaram a se deteriorar: o menor crescimento afetou a receita tributária e os planos de estímulo aumentaram o gasto. Para 2008, o déficit público na UE e na Zona Euro passou a 2.3% e 1.9%, respectivamente. Ou seja, a redução da receita tributária é produto da crise, não sua causa. 
 
Aqui entra a segunda vertente na cosmogonia direitista sobre a crise: é a ideia de que trabalhadores e sindicatos distorceram os salários, provocaram perdas da produtividade e isso levou à crise nas contas externas dos países da periferia europeia. Segundo este raciocínio, os custos trabalhistas na maior parte dos países da periferia europeia aumentaram muito mais do que na Alemanha e explicaria o déficit na conta corrente daqueles países. 
 
O corolário de política econômica que se desprende deste diagnóstico é simples: é preciso impor restrições salariais. Mas agora o Banco Central Europeu (BCE) acabar de revelar um estudo sobre a relação entre o déficit na conta corrente e os custos salariais nos países da União Europeia. É uma análise que derruba todas as interpretações oficiais sobre a crise e as políticas aplicadas para enfrentá-la, em especial a política de austeridade fiscal. 
 
Utilizando técnicas estatísticas padrão, o trabalho do BCE estabelece que, para o período 1995-2012, as mudanças no saldo da conta corrente precederam as mudanças nos custos salariais unitários. Ao mesmo tempo, a análise demonstra que as mudanças nos custos trabalhistas tiveram muito poucos efeitos sobre as mudanças nos saldos da conta corrente. 
 
A deterioração nas contas externas dos países da periferia não se deveu aos aumentos nos custos salariais. Assim, não é certo que o problema nas contas externas se deva ao fato de os sindicatos pressionarem irresponsavelmente e isso levou à perda da competitividade. 
 
Este ponto é importante: já são 23 os países europeus que assinaram o pacto Euro Plus, que está baseado na ideia de que a perda da competitividade (por aumentos salariais) explica os desequilíbrios entre países com superávit e aqueles com déficit. O Euro Plus estabelece que os países signatários devem adotar medidas para melhorar sua competitividade de custos. Uma vez mais se demonstra que as bases neoliberais deste pacto não têm fundamento.

Os dados revelam que a crise não se originou de uma postura irresponsável em matéria fiscal, e também não foi provocada por aumentos salariais insustentáveis. Pelo contrário, um dos fatores mais importantes é o dos fluxos do capital: o estudo do BCE conclui que os fluxos de capital estão mais relacionados à deterioração da competitividade. E isto não me surpreende: no contexto de uma atividade bancária em que as regulações foram quitadas, os créditos bancários e o boom imobiliário efetivamente geraram uma forte distorção salarial.
 
A conclusão é que é necessário controlar os fluxos de capital, mas a direita prefere castigar os trabalhadores em vez de limitar a capacidade do capital financeiro.  

Câmara aprova Marco Civil da Internet



Câmara aprova Marco Civil da Internet

Texto manteve 'neutralidade' e desobrigou guarda de dados no Brasil. Prioritário para o Planalto, projeto seguirá agora para análise do Senado.

Apoiadores acompanharam da galeria da Câmara legislação considerada a constituição da rede (Foto: Gustavo Lima/Câmara)Apoiadores acompanharam da galeria lei considerada Constituição da rede (Foto: Gustavo Lima/Câmara)
Após meses de intensas negociações, a Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (25), por votação simbólica, a criação do Marco Civil da Internet, projeto considerado uma espécie de constituição da rede mundial de computadores. Após concessões do governo em pontos antes considerados "cruciais" pelo Planalto, partidos aliados e da oposição retiraram todas as 12 propostas de alteração ao texto que haviam sido apresentadas em plenário 

Até o PMDB, maior crítico ao relatório do deputado Alessandro Molon (PT-RJ), cedeu e se absteve de defender quaisquer modificações na redação. A proposta, que estabelece direitos e deveres de usuários e provedores de rede, seguirá agora para análise no Senado antes de ir à sanção presidencial.
Considerado "prioridade" pelo governo, o Marco Civil da Internet impedia a deliberação de outros projetos de lei no plenário desde outubro do ano passado, já que tramitava em regime de urgência.


Neutralidade
Um dos pilares do projeto, a neutralidade de rede, sofreu algumas alterações no texto, mas foi mantido. Por esse princípio, os provedores não podem ofertar conexões diferenciadas, por exemplo, para acesso somente a emails, vídeos ou redes sociais. O principal entrave estava na regulamentação do princípio pelo Poder Executivo, principalmente em relação às exceções à norma.
O texto original previa que a neutralidade fosse regulamentada por meio de decreto presidencial.
Partidos da oposição e da base aliada, sobretudo o PMDB, temiam que assim o presidente da República fizesse alterações significativas sem ouvir o Congresso. Para obter acordo, Molon especificou que o tema seria regulamentado "para fiel execução desta lei", sem autonomia para grande modificação por parte do presidente.
O objetivo é destacar que a regulamentação serve exclusivamente para viabilizar a aplicação da Lei do Marco Civil da Internet. Além disso, o relator incluiu ainda a obrigatoriedade de o presidente ouvir a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e o Comitê Gestor da Internet (CGI) antes de formular o decreto.
De acordo com o relator do texto, as exceções servirão para garantir prioridade a "serviços de emergência" e a qualidade de algumas transmissões, como vídeos ao vivo. Assim, a transmissão de e-mails, por exemplo, pode ter menor prioridade no tráfego de dados em prol de outros serviços.
Críticos da neutralidade dizem que o princípio restringe a liberdade dos provedores para oferecer conexões diferenciadas conforme demandas específicas de clientes e que sua aplicação obrigatória pode encarecer o serviço para todos indistintamente. A proposta não impede a oferta de pacotes com velocidade diferenciada.
O relator do Marco Civil da Internet, Alessandro Molon (PT-RJ), entrega relatório ao presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN) (Foto: Gustavo Lima/Câmara)O relator do projeto, Alessandro Molon,
entrega relatório ao presidente da Câmara,
Henrique Alves (Foto: Gustavo Lima)
Armazenamento de dados
Para viabilizar a aprovação da proposta, o governo também abriu mão do armazenamento no Brasil de dados de usuários brasileiros, com a instalação de data centers no país de empresas de internet, como o Google e o Facebook.
A medida tinha o objetivo de garantir a privacidade dos internautas e de dados do próprio governo brasileiro diante das denúncias de que os Estados Unidos teriam espionado comunicações da presidente Dilma Rousseff com ministros e assessores.
No entanto, parlamentares da base aliada se opunham à proposta argumentando que a exigência iria encarecer o acesso na internet. Para obter acordo, o relator da proposta, Alessandro Molon (PT-RJ), retirou esse trecho do projeto, com o aval do Planalto, mas reforçou que empresas internacionais precisam respeitar a legislação brasileira no tocante a transmissões de rede ocorridas no país.
"Em qualquer operação de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, dados pessoais ou de comunicações por provedores de conexão e de aplicações de internet em que pelo menos um desses atos ocorram em território nacional, deverá ser obrigatoriamente respeitada a legislação brasileira, os direitos à privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao sigilo das comunicações privadas e dos registros", diz artigo do projeto do Marco Civil.
Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente"
Art. 19 do Marco Civil da Internet,
em trecho referente à liberdade de expressão
Retirada de conteúdo
De acordo com o projeto, provedores de conexão à web e aplicações na internet não serão responsabilizados pelo uso que os internautas fizerem da rede e por publicações feitas por terceiros.
Atualmente não há regras específicas sobre o caso e as decisões judiciais variam - alguns juízes punem sites como o Facebook e Google por páginas ofensivas criadas por usuários, enquanto outros magistrados optam por penalizar apenas o responsável pelo conteúdo.
De acordo com a nova legislação, as entidades que oferecem conteúdo e aplicações só serão responsabilizadas por danos gerados por terceiros se não acatarem ordem judicial exigindo a retirada dessas publicações. O objetivo da norma, segundo Molon, é fortalecer a liberdade de expressão na web e acabar com o que chama de "censura privada".
O trecho era alvo de polêmica, sobretudo entre parlamentares do PMDB. Para o partido, esse artigo ajuda os provedores, mas prejudicará pessoas que eventualmente se sintam constrangidas por algum conteúdo publicado que seja evidentemente ilegal. Isto porque os provedores poderão não se sentir obrigados a retirar o conteúdo após a mera notificação do usuário, já que eles terão a garantia de que só serão responsabilizados se descumprirem ordem judicial exigindo a indisponibilidade da publicação.
Fim do marketing dirigido
Pelo texto aprovado, as empresas de acesso não poderão "espiar" o conteúdo das informações trocadas pelos usuários na rede. Há interesse em fazer isso com fins comerciais, como para publicidade, nos moldes do que Facebook e Google fazem para enviar anúncios aos seus usuários de acordo com as mensagens que trocam.
Essas normas não permitirão, por exemplo, a formação de bases de clientes para marketing dirigido, segundo Molon. Será proibido monitorar, filtrar, analisar ou fiscalizar o conteúdo dos pacotes, salvo em hipóteses previstas por lei.

Sigilo e privacidade
O sigilo das comunicações dos usuários da internet não pode ser violado. Provedores de acesso à internet serão obrigados a guardar os registros das horas de acesso e do fim da conexão dos usuários pelo prazo de seis meses, mas isso deve ser feito em ambiente controlado.
A responsabilidade por esse controle não deverá ser delegada a outras empresas.

Não fica autorizado o registro das páginas e do conteúdo acessado pelo internauta. A coleta, o uso e o armazenamento de dados pessoais pelas empresas só poderão ocorrer desde que especificados nos contratos e caso não sejam vedados pela legislação.
Relator e líder do governo defendem projeto
Após a aprovação, o relator disse acreditar que a Câmara melhorou a proposta do governo. Para Alessandro Molon, apesar das alterações e concessões, ficaram garantidos os princípios que ele considera pilares do Marco Civil da Internet: a neutralidade na rede, a privacidade e a liberdade de expressão.
Hoje nada impede que a navegação do usuário seja gravada, identificada e vendida, violando a privacidade do usuário. Com o Marco Civil isso não poderá acontecer"
Alessandro Molon (PT-RJ),
relator do Marco Civil da Internet
"Hoje nada impede que a navegação do usuário seja gravada, identificada e vendida, violando a privacidade do usuário. Com o Marco Civil isso não poderá acontecer. Também não existe lei que garanta que não haverá cobrança para uso diferenciado do acesso à internet, para quem quiser baixar música, assistir vídeo. O marco proíbe isso e coloca em lei essa proibição, algo que nos Estados Unidos caiu no Judiciário, mas ainda não tem lei", explicou.
O líder do governo na Câmara, deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), agradeceu pela aprovação e disse que os deputados superaram preocupações de cunho político e ideológico. Ele negou que a lei seja uma forma de o governo intervir na liberdade da internet.

Os lobinhos de Wall Street

Um filme de Woody Allen, outro de Martin Scorsese, o mundo insalubre das finanças e a vida como ela é. Por Thomaz Wood Jr.

wall street


Em 2013, dois ícones do cinema apontaram suas lentes para o extravagante mundo das finanças. Woody Allen escreveu e dirigiu Blue Jasmine, narrando a história de Jeanette “Jasmine” Francis (Cate Blanchett), esposa de um milionário que é preso por fraudes financeiras. Martin Scorsese dirigiu e coproduziu O Lobo de Wall Street, baseado nas memórias de Jordan Belfort, um corretor que acumulou fortuna com negócios fraudulentos, até ser encarcerado.
O filme de Allen foi comparado à peça Um Bonde Chamado Desejo, de Tennessee Williams, por similaridades relacionadas aos personagens e à história. O vaporoso mundo das finanças constitui a origem da riqueza e da tragédia de Jasmine. No filme de Scorsese, Jordan Belfort (Leonardo DiCaprio) encarna os excessos e a flexibilidade moral frequentemente associados ao mundo das finanças. Personagens, estilo e enredo remetem a Goodfellas (1990), retrato primoroso da ascensão e queda de uma família mafiosa, e Cassino (1995), registro singular da interseção entre negócios e crimes em Las Vegas.
Obviamente, há muito mais do que personagens extravagantes e estripulias fraudulentas nos templos do dinheiro. Kevin Roose, autor de Young Money: Inside the Hidden World of Wall Street’s Post-Crash Recruits (Grand Central Publishing), lançado em fevereiro de 2014, pesquisou os lobinhos que habitam os porões do sistema. Roose acompanhou, por três anos, jovens recrutas de renomadas instituições financeiras.
Seus personagens vieram das melhores universidades, cheios de energia, com alguns ideais e muita vontade de enriquecer. Entretanto, viram seu entusiasmo ser arrefecido por pilhas de relatórios enfadonhos, jornadas intermináveis e chefes intolerantes. O autor informa que os salários ainda são respeitáveis, porém não houve entrevista na qual os jovens profissionais não tivessem reclamado do declínio de sua qualidade de vida e confessado problemas relacionados à saúde física e mental.
Roose concluiu que três fatores explicam por que Wall Street (leia-se: partes consideráveis do mundo das finanças) é um lugar insalubre. O primeiro fator relaciona-se às longas horas de trabalho. Muitos profissionais de outras ocupações trabalham duro. A diferença no mercado financeiro é a turbulência e a instabilidade. Pedidos urgentes podem vir a qualquer momento, do dia ou da noite, e o atendimento tem de ser perfeito e imediato. A consequência é que os jovens profissionais vivem em estado permanente de alerta e ansiedade.
O segundo fator é o vil metal. Indústrias vivem ciclos. Informática, telefonia móvel e consultoria tiveram seus bons momentos, atraindo recrutas com boas perspectivas de carreira e bons salários. Mas nada dura para sempre. O mercado financeiro também teve anos felizes. Hoje, é um mundo em transição. Ainda há bons empregos e bons salários, mas os controles aumentaram, as margens de lucro tendem a cair e a possibilidade de demissão projeta uma sombra permanente sobre os mais jovens.
O terceiro fator refere-se ao senso de propósito. Segundo Roose, jovens profissionais têm objetivos que transcendem o acumulo de riqueza. Alguns são iludidos por conversas sobre “negócios socialmente responsáveis” e “investimentos verdes”. Porém, rapidamente, o discurso da moda cede espaço ao pragmatismo: no mundo das finanças alguém perde para outro alguém ganhar. E o objetivo é estar do lado dos ganhadores. Naturalmente, há sempre um contingente de jovens “espertos”, capazes de conviver sem problemas de consciência com tal lógica.
O quadro não é diferente nos trópicos. Também aqui muitos universitários almejam o enriquecimento rápido e o status de pertencer a uma grande instituição financeira. No entanto, colegas professores coletam com frequência relatos sinistros, de alunos e ex-alunos, lutando contra úlceras e depressões. Trocam amigos e família por trabalho. Hipotecam a saúde por prêmios e bônus, esperando que o corpo possa ser resgatado mais tarde. A satisfação, ou orgulho, de trabalhar para uma grande instituição financeira está cedendo lugar à indiferença, ou ao embaraço, de estar ligado a um templo do dinheiro. E o contracheque cada vez mais magro não parece mais ser suficiente para adoçar a consciência.

quarta-feira, 19 de março de 2014

Contra os clichês econômicos dos Estados Unidos


É fácil e mesmo divertido argumentar a respeito de ideias. É muito mais difícil argumentar a respeito de fatos. E Piketty nos dá fatos para argumentar.


Divulgação

O Capital no Século XXI foi escrito na tradição dos grandes textos econômicos. Onde John Maynard Keynes escreveu A Teoria Geral do Emprego, do Lucro e do Dinheiro, em resposta aos “economistas clássicos” e Karl Marx escreveu O Capital em resposta aos “economistas burgueses”, Thomas Piketty escreve em resposta aos “economistas dos EUA”. Como seus antecessores, ele não mede palavras. Depois de dar aulas no MIT aos 22 anos, ele voltou a Paris aos 25, em 1995, dizendo: “não achei o trabalho dos economistas estadunidenses muito convincente”.
 
O método de Piketty é uma crítica explícita aos acadêmicos “preocupados demais com problemas matemáticos insignificantes, de interesse apenas para eles mesmos”. Embora as ferramentas da matemática sejam elementos de importância fundamental para a moderna profissão da economia, Piketty está certo ao chamar a todos os cientistas sociais, inclusive os economistas, a “começarem com as questões fundamentais e tentar respondê-las”.

Piketty faz duas questões fundamentais no seu novo livro: “O que realmente sabemos a respeito de como a riqueza e a renda evoluíram, desde o século XVIII, quais as lições que podemos obter desse conhecimento para o século atual?”.
 
Piketty e seus colegas passaram os últimos anos reunindo um banco de dados da renda mundial, sua investigação detalhada na renda dos países ao redor do globo, abrangendo várias décadas. Em alguns casos – França e Reino Unido – ele também sustenta a análise em fatos relacionados à acumulação de riqueza ao longo de séculos. Como ele diz, “foi pacientemente estabelecendo fatos e padrões e então comparando diferentes países que pudemos identificar os mecanismos em operação e ganhar, assim, uma ideia clara do futuro”.


Informado por uma base de dados histórica e transnacional, Piketty avalia – e rejeita – uma série de conclusões geralmente aceitas no pensamento econômico, embora admita, cuidadosamente, as limitações inevitáveis das fontes “imperfeitas e incompletas”. O principal achado de sua investigação é que o capital ainda importa. Os dados mostram um ressurgimento recente nos países desenvolvidos da importância do rendimento de capital em relação à renda nacional, de volta a níveis vistos pela última vez antes da Primeira Guerra Mundial.
 
Na análise de Piketty, sem um crescimento econômico rápido – que ele argumenta ser altamente improvável agora, que o crescimento populacional está se tornando mais lento – retornos de investimentos continuarão a crescer mais rápido do que os da produção. As desigualdades de heranças e de renda continuarão crescentes, possivelmente em níveis jamais vistos anteriormente.


Dentre outras conclusões, os dados levam Piketty a descrever o argumento popular segundo o qual vivemos numa era de nossos talentos e capacidades importando mais como “otimismo irracional”. Os dados também o levam a rejeitar a ideia de que a desigualdade de salário cresceu na medida em que a mudança tecnológica aumentou a demanda por trabalhadores altamente qualificados e bem educados.

Em vez disso, a evidência de Piketty sugere que é a ascensão do que ele chama de “supercomando” dos 1%, desde 1980, que está impulsionando o aumento da desigualdade de renda. É aqui que Piketty dá o golpe mais sério nos economistas.
 
Na sua discussão sobre os prósperos 1%, ele observa que “dentre os membros dos grupos dos super ricos, estão economistas acadêmicos, muitos dos quais acreditam que a economia dos EUA está funcionando muito bem e, em particular, que ela recompensa os talentos e os méritos acurada e precisamente. Esta é uma reação humana muito compreensível”. Piketty concorda que, no longo prazo, os investimentos em educação são um componente importante para qualquer plano voltado à redução das desigualdades no mercado de trabalho e para a melhoria da produtividade. Mas por si sós, eles não são suficientes.

Este livro é importante pelos seus achados, assim como pelo modo como Piketty neles chega.  É fácil – e divertido – argumentar a respeito de ideias.  É muito mais difícil argumentar a respeito de fatos. E fatos é o que Piketty nos dá, ao passo que pressiona o leitor a se engajar na jornada de suas implicações.

 
(*) Heather Marie Boushey é diretora executiva do Washington Center for Equitable Growth e integra o Center for American Progress, um think tank dos EUA. Artigo publicado na The American Prospect.

Governo faz concessão para tentar votar logo Marco Civil


Ministros tentam viabilizar votação das regras da internet para esta quarta. Deputado Molon (PT-RJ) retirou artigo que exigia data centers no Brasil.

Após reunião entre líderes da base aliada e os ministros Ideli Salvatti (Relações Institucionais) e José Eduardo Cardozo (Justiça), o relator do Marco Civil da Internet, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), disse que o governo abriu mão da instalação de data centers no Brasil com o objetivo de tentar votar o projeto nesta quarta-feira (19) – embora o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) já tivesse anunciado a votação para a próxima semana.
O relatório de Molon previa que as empresas provedoras de internet fossem obrigadas a instalar seus bancos de dados, os data centers, no Brasil, mesmo que suas sedes sejam em outros países. O objetivo era garantir que a lei brasileira fosse aplicada, caso houvesse alguma demanda judicial. Esse trecho foi incluído no Marco Civil da Internet após as denúncias de espionagem do governo dos Estados Unidos, que teria monitorado a comunicação entre integrantes do governo brasileiro.
O relator afirmou que haverá uma alteração no artigo 11º do Marco Civil, para reforçar a obrigatoriedade de as empresas se submeterem à legislação brasileira. Com isso, o artigo 12º, que obrigava a instalação das bases de dados no Brasil, será retirado. Até a votação do projeto, afirmou Molon, será acertada a melhor redação para esse trecho, de forma a se garantir a "soberania" brasileira.
"Não haverá nenhum prejuízo até porque esse trecho foi incluído após o escândalo de espionagem. Nós entendemos que com o reforço do artigo 11, o problema fica bem resolvido", disse o deputado.
Regulamentação por decreto
Outro trecho polêmico do Marco Civil é o que permite a regulamentação sobre a neutralidade da rede por meio de decreto presidencial. A neutralidade da rede é a garantia de que não serão cobrados valores diferentes de acordo com o conteúdo acessado pelo usuário. Caso a neutralidade não seja mantida no texto, o provedor de internet poderia disponibilizar uma velocidade menor, caso o usuário acessasse um conteúdo que não esteja previsto em seu pacote, além de cobrar a mais por isso.

O governo não abre mão da neutralidade, mas quer poder regulamentá-la por meio de decreto presidencial após a aprovação do Marco Civil. De acordo com Molon, o decreto pode determinar, por exemplo, que a transmissão de uma cerimônia ao vivo tenha preferência sobre o envio de emails, para garantir a qualidade da primeira.
"Se não for priorizado, o vídeo congela o tempo todo", exemplificou o relator. "É fundamental que essas exceções existam, e elas devem estar regulamentadas. O que ficou claro é que a base entendeu que deveria ser por decreto. O decreto está mantido", anunciou.
O acordo com os líderes da base, no entanto, prevê que antes da elaboração do decreto sejam ouvidos a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e o Comitê Gestor de Internet (CGI).
Com esses esclarecimentos, afirmou Molon, haverá condições de votar o Marco Civil nesta quarta-feira (19).
"Não há nenhum desejo do governo de adiar a votação. Pelo contrário, o governo quer votar amanhã [quarta]", afirmou.
Os líderes do PROS, Gilvado Carimbão (AL), e do PSD, Moreira Mendes (RO), afirmaram que os colegas presentes na reunião concordaram em colocar o texto em votação.
Além dos dois, também participaram do encontro os deputados Bernardo de Vasconcellos (PR-MG), Jandira Feghali (PCdoB-RJ), Antônio Brito (PTB-BA), Luiz Couto (PT-PB) e Fernando Ferro (PT-PE).
O líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), pivô da crise política entre o partido e o governo e contrário ao atual texto do Marco Civil da Internet, não participou.